27 de maio de 2009

Réquiem para a Mata Atlântica

Outro dia, em um debate, uma pessoa me perguntou se "esse negócio de mudanças climáticas não era um plano de cientistas de esquerda para desestabilizar o Bush". Respondi que os moradores de Santa Catarina provavelmente não tinham mais dúvidas sobre isso, depois do furacão e das chuvas e deslizamentos do ano passado. Ainda não haviam começado as chuvas no Norte/Nordeste, nem a seca no Sul/Centro-Oeste.

Lembrei-me disso porque, de vez em quando, as pessoas vêm comentar comigo que a questão do Desmatamento Zero na Amazônia é importante, mas... é muito longe e as pessoas não tem como se mobilizarem por algo tão distante.

Pois bem, aí estão os números da Mata Atlântica que é o nosso quintal, inclusive com o prazo para sua extinção: 40 anos. Os efeitos do desmatamento estão presentes e visíveis para qualquer um que pegue a estrada em uma viagem de fim de semana, daquelas que nós, pessoas da cidade, fazemos para "ver o verde". A menos que nos conformemos em olhar para o capim, vai ficar cada vez mais difícil!

Mesmo assim, assistimos placidamente a extinção do bioma Mata Atlântica, com toda sua maravilhosa biodiversidade, assim como "naturalizamos" as consequências das mudanças climáticas, as condições mais insalubres de vida nas cidades, ou a destruição da Amazônia. Mesmo que, conscientemente, nos indignemos e nos preocupemos, não conseguimos transformar estes sentimentos em uma ação prática. Alguns, nem tentam.

Durante o FSM, em outro debate realizado em uma tenda montada em frente a um fragmento de mata, um dirigente do PSOL de Pernambuco perguntou - depois de eu ter explicado os efeitos que as mudanças climáticas poderiam provocar no Brasil e a importância de preservar a floresta amazônica - como transformar essa questão em uma campanha de massas, já que era difícil mobilizar as pessoas sobre esses temas.

Confesso que minha primeira vontade foi de associar o desmatamento da Amazônia a um escândalo de corrupção qualquer, para ver se animava o companheiro, mas engoli a "gracinha" e disse:

- É só ter vontade política.

21 de maio de 2009

A ficha não caiu

Parece que a Conlutas resolveu adotar a mesma tática da maioria da direção do PSOL, de denúncia da corrupção. Isso fica claro quando lemos a nota disponível em http://www.conlutas.org.br/exibedocs.asp?tipodoc=noticia&id=3086. É evidente que existe, por trás do afã investigativo da direita, uma tentativa de colocar a questão da privatização da Petrobras. Evidente, também, que o governo Lula e o PT aparelharam a Petrobras, como "nunca antes nesse país". Mas restringir a luta e o discurso apenas à corrupção e a reestatização é muito pouco.

Primeiro, a questão da reestatização, com "controle dos trabalhadores". Este apêndice geralmente é colocado como um "item de segurança", quando não se sabe ao certo como explicar o que precisa ser mudado. Pelo o que eu tenho visto na Campanha o Petróleo Tem Que Ser Nosso, uma gestão dos trabalhadores não alteraria muito a operação da Petrobras.

Dos governistas da CUT aos ultra-anarquistas - com honrosas exceções, como a FOE, a Intersindical, pronunciamentos da diretoria do Sindpetro-RJ e alguns poucos ambientalistas - que passaram pelas Plenárias da Campanha, o discurso da esquerda é o de abrir as torneiras e "deixar queimar", sob o álibi de que, desta vez, o dinheiro seria usado em saúde, educação, saneamento e reforma agrária, seguindo o discurso do governo Lula a respeito do pré-sal. Note-se, também, que o meio ambiente passa longe nessas prioridades.

É estranho que se assuma o discurso de Lula de forma acrítica. Porque o governo Lula já teria, há muito tempo, como fazer esta transferência de recursos, se não estivesse preocupado em juntar dinheiro para mandar para os rentistas nacionais e internacionais. Mas nem é esse o caso, já que o governo Lula é tudo menos um governo dos trabalhadores, por mais que a CUT o apóie. Outra discussão pertinente seria se a CUT é dos trabalhadores, mas isto é um outro post, para uma outra hora.

O xis dessa primeira questão é que o controle dos trabalhadores, que foi usado para diferenciar esta Petrobras proposta pela Conlutas, de uma Petrobras reestatizada, segundo o modus operandi vigente, ainda é pouco. Além de reestatizada, a Petrobras tem que ser pública, ou seja, para atender os interesses, não dos seus acionistas, mas da maioria da população brasileira. Esta é a contraposição real com os direitistas do DEM do PSDB! O modelo estatal atual, substituindo-se os apaniguados petistas pelos seus próprios, não causaria desconforto para eles.

Como já escrevi em outro post, uma Petrobras pública não empurraria com a barriga, por exemplo, a redução do enxofre no combustível, como esta diretoria da Petrobras fez, provocando doenças respiratórias que condenarão à morte milhares de pessoas, além de deixar outras milhares enfermas. Nesse caso, se falarmos em Petrobras assassina é um exagero, a sua diretoria certamente o é. DIRETORIA DA PETROBRAS ASSASSINA!

Em segundo lugar, é preciso interromper a lógica do desenvolvimento a qualquer preço, implementada pela Petrobras, que segue a lógica do próprio governo. Aqui são os recursos naturais – o petróleo – que estão sendo mais uma vez exauridos (doados?) sem nenhum projeto eco-estratégico. Como falar em desenvolvimento, ao custo do esgotamento dos recursos? E o que diz a Conlutas sobre a Petrobras: "colocá-la a serviço da classe trabalhadora e da população mais carente, vendendo gasolina, diesel e gás mais barato, além de fortalecer o patrimônio e a soberania nacional".

Com todo o respeito que os companheiros me merecem, esta é a mesmíssima visão do governo Lula. Desde quando queimar um recurso ainda estratégico significa fortalecer o patrimônio e a soberania nacional? Principalmente quando todo mundo sabe que ele se encontra à beira do esgotamento. De que maneira isto fortalece nossa soberania? Somente no cálculo do PIB, que é um índice do capital para aferir o capital, é que a extração de uma riqueza é vista como uma coisa positiva. Qualquer estudante de contabilidade sabe que quando você vende algo que lhe pertence, você perde patrimônio.

O que nos remete à última questão: a questão ambiental. Como já disse antes, sobre ela, nenhuma palavra, assim como no cálculo do PIB, que despreza os custos ambientais. Sem fazê-lo, o capital não teria como falar em desenvolvimento em nenhum país, nas últimas décadas. A começar pela Segunda Guerra Mundial, cujos custos ambientais e sociais ficaram de fora da conta, da forma como o capital superou a Depressão de 1929.

Pegando um mega-exemplo mais recente: se os tremendos passivos ambientais, provocados pelo seu modelo de desenvolvimento acelerado, fossem levados em consideração, a China amargaria índices negativos, ao invés da pseudo pujança que exibe, e que serve de modelo para vários outros países do Sul, como o Brasil de Lula, que experimentou índices de desenvolvimento que eludiram o desmatamento da Amazônia pelo agronegócio, entre tantas outras catástrofes ambientais.

Como disse recentemente Emanuel Cancella, diretor do Sindpetro-RJ, o dinheiro do pré-sal deve ser usado também para a pesquisa e implementação de matrizes energéticas limpas e renováveis, como a solar e a eólica. Outra parte da receita deve ser usada em obras que adaptem as cidades aos efeitos – alguns, infelizmente, já presentes – das mudanças climáticas, provocadas pela escalada do aquecimento global.

E a nota da Conlutas, na contramão da luta contra esta ameaça à humanidade, fala em vender gasolina e diesel mais barato, sem levar em consideração o efeito dessas medidas demagógicas: mais veículos rodando; mais CO2 vomitado para a atmosfera; maior velocidade no aquecimento médio do planeta.

Apesar da veemência, não quero deixar a falsa impressão de que se trata de um post contra a Conlutas. Em post recente, desanquei uma resolução do PSOL que, da mesma forma que essa nota, voltou as costas para mudanças climáticas e seus efeitos, como de resto faz a grande maioria dos partidos e organizações de esquerda, além dos movimentos sociais. Para eles, infelizmente, a ficha ainda não caiu.