28 de maio de 2011

Reflexões sobre a votação do novo Código Florestal

Passada a votação na Câmara, que resultou na aprovação do relatório do deputado Aldo Rebelo, mais conhecido nas redes sociais como AldoNegócio, convém dar um chute na frustração e na vontade de desistir, e tentar analisar o que aconteceu. Até porque, a luta ainda não terminou!

Sem preocupação em escrever uma avaliação de fundo, mais completa, já que ainda não consegui construir o afastamento necessário para tanto, gostaria de dividir com vocês algumas reflexões produzidas “a quente”, no meio da tormenta que foi aquela fatídica terça-feira.

Quem votou o novo Código? Apesar do crescimento de sua bancada, e de sua organização, os ruralistas não são os únicos responsáveis. Os 410 votos juntam à bancada ruralistas, os fundamentalistas religiosos, a bancada das empreiteiras, os oportunistas do chamado Partido QueroMeu, uma parte do que se convencionou chamar esquerda, além do baixo-clero.

Qual foi o papel do governo Dilma? Pode-se dizer que a presidente Dilma repetiu a candidata. Ao menor sinal de perigo, abriu mão de seu discurso, para atender às chantagens da direita. Ao mesmo tempo, continua falando grosso com os movimentos sociais. Se na campanha, mulheres e LGBTTs foram para o sacrifício, agora a natureza e novamente os LGBTTs foram os imolados. Porém, é importante deixar claro que o perfil desenvolvimentista de Dilma é muito pouco preocupado com o meio ambiente.

Qual a relação do governo com sua base aliada? Na verdade, ficou claro que não é o governo Dilma que tem uma base aliada, mas, sim, a base aliada que tem (como permanente refém) o governo Dilma. Esta base de apoio ao governo, construída em cima de acordos de ocasião e barganha de cargos, que tenta costurar partidos heterogêneos e sem identidade ideológica, vai ser sempre um problema para os governos do petismo. Lula tentou resolver parte deles, usando a fisiologismo do Mensalão. Dilma vai permanecer em permanente cativeiro, apenas com a troca dos carcereiros.

AldoNegócio e o seu ex-PCdoB se tornaram ruralistas? Durante todo o processo de votação do Código, várias vezes eu mesmo e outr@s companheiros fizemos uma ligação direta entre o apoio decidido de Aldo aos interesses ruralistas e o financiamento destes à sua campanha. Isto é real e deve ser denunciado como mais uma prova da privatização do modelo de representação política hoje existente no Brasil. Mas é necessário reconhecer que o principal neste episódio é o alinhamento histórico dos comunistas do PCdoB ao produtivismo e ao desenvolvimentismo. AldoNegócio, para contestar os argumentos de ambientalistas e cientistas, várias vezes colocou em dúvida os cientistas do IPCC e a idéia de um aquecimento global provocado pela ação do homem, ou melhor, pela ação do capitalismo sobre a natureza. Neste contexto, as florestas são realmente um entrave para o modelo de desenvolvimento que ele e seu partido defendem.

E como foi o comportamento geral da esquerda, com ou sem aspas? O PSTU e o PCB, seja por declarações ou, mesmo, pelo conteúdo de seus sites, praticamente ignoraram a votação. Este comportamento é bastante coerente com o pouco destaque que as questões ambientais tem na esquerda mais ortodoxa, que ainda as encara como uma questão, no limite, tática. O ranço de posições construídas em outro momentos históricos, e a teimosia em não copnsiderar o marxismo uma coisa viva, em permanente evolução, faz com que estes partidos, e boa parte da esquerda, simplesmente se coloque fora da grande contradição do capital neste começo de século. Quanto à chamada “esquerda petista”, mais uma vez se viu às voltas como suas próprias contradições, de fazer parte de um partido cuja atuação como governo ela deveria combater. Parte dela votou contra o Código, o que não deixou de ser importante.

O racha no PT na votação é positivo, ou apenas mais do mesmo? O fato de vári@s deputad@s do PT terem votado contra o Código reabriu a eterna discussão sobre se o PT, ou pelo menos alguns de seus filiados, ainda está em disputa. Se fosse essa a primeira “rebelião” no interior do partido, ainda manteria algum otimismo. Mas a experiência do lulo-petismo tem mostrado que, no frigir dos ovos, ou melhor dizendo, no queimar das florestas, estes rebeldes precoces tendem a interromper estes acessos de rebeldia, em prol da governabilidade, das tais “conquistas”, ou simplismente pelo conforto de estarem no útero confortável da nave-mãe PT.

O PSOL finalmente pode ser considerado um partido ecossocialista? Ainda não. É inegável que nestes últimos anos, por conta da insistência d@s ecossocialistas do PSOL, e pela agudização das questões socioambientais, o partido vem, pouco a pouco, assumindo estas lutas como prioritárias dentro da luta anticapitalista. Nesse sentido, o papel do deputado Ivan Valente, e da bancada do PSOL como um todo, é fundamental. Importante também destacar a criação do Setorial Ecossocialista do partido. Porém, ainda falta subir alguns degraus para que a contradição entre o capital e a natureza seja vista como estratégica pelo PSOL como um todo. Ainda persiste, no interior do partido, uma visão produtivista – ainda que mais crítica e menos entusiasmada – fiel à ilusão, cada vez mais desmentida pelos fatos, de um progresso ilimitado. De qualquer forma, o desempenho do PSOL tem sido excelente!

Como Marina Silva e o PV se comportaram? Junto com o PSOL, foram as vozes destoantes na Câmara, e centro da resistência à motoserra. Embora tanto Marina, quanto o PV, esbarrem nos limites que eles mesmo construíram, no combate à degradação socioambiental, ao não questionarem a respónsabilidade do capitalismo neste processo, ficou demostrada a possibilidade de alianças pontuiais com eles, em torno de demandas ambientais, desde que fiquem claros estes limites. Cabe a nós, ecossocialistas, através do nosso discurso e ação, mostrar aos setores da sociedade preocupados com o meio ambiente, a incapacidade de uma luta mais efetiva contra a barbárie socioambiental, sem que se questione o próprio modelo capitalista.

O movimento ambientalista respondeu a este ataque. à altura? Não. Mesmo que a discussão sobre as mudanças no Código Florestal tenham demorado a ter destaque na mídia, é forçoso reconhecer que faltou mobilização da sociedade contra elas. Esta constatação, mesmo levando-se em conta a desmobilização da sociedade, leva a uma avaliação crítica de como hoje o ambientalismo funciona. Altamente “Ong-dependente”, este movimento repousa em cima da substituição da participação direta, pela delegação da militância ambiental aos “ambientalistas profissionais” (com aspas). O problema é que, ao fazer esta delegação, a sociedade, ou pelo menos a parte dela preocupada com as questões socioambientais, se acomoda, não se mobiliza, e deixa que outros definam as agendas e as formas de luta. Ficou claro neste episódio da substituição do Código Florestal por um Código do Desmatamento, como já havia ficado claro na luta contra Belo Monte, que, ou mudamos o perfil de organização e mobilização contra as ameaças e agressões ao meio ambiente, ou colecionaremos outras derrotas nos próximos anos. A luta contra o ataque capitalista contra a natureza tem que ir além de um click ou uma postagem inspirada nas redes sociais.